quinta-feira, 1 de dezembro de 2011


Problemas ecológicos da construção de gasodutos no Cáspio


Gasparian: O nosso convidado é director-geral do Fundo de Segurança Energética Nacional, Konstantin Simonov. O sector energético está tradicionalmente no centro de atenção, inclusive os trajectos trans-cáspios. Quais são os problemas ecológicos da construção de um gasoduto trans-cáspio, dos quais falam hoje muitos peritos?
Simonov: Desde o ponto de vista ecológico no Cáspio é necessário entender uma coisa simples. Quando, digamos, os representantes do Turquemenistão, ou do Azerbaijão, ou da Europa falam da possibilidade de construir rapidamente um gasoduto trans-cáspio, porque os russos já construíram o Nord Stream no Báltico, é necessário entender uma coisa simples: o Báltico e o Cáspio têm diferenças de princípio. Por quê? Porque o Báltico é um sistema ecológico aberto e o Cáspio é um sistema ecológico encerrado. Qualquer avaria ecológica no Cáspio será uma verdadeira catástrofe. Porque esta avaria terá lugar num sistema ecológico encerrado que o prejudicará extraordinariamente. Neste plano, seria absolutamente insensato comparar o Báltico com o Cáspio. Por outro lado, há também outros momentos que distinguem o Cáspio e o Báltico, são compreensíveis as comparações, porque no Báltico acabamos de construir a primeira linha do Nord Stream e também houve muitos problemas ecológicos. Quanto me lembro, os cépticos diziam que o Nord Stream não seria construído nunca, porque os russos devem entender-se com cada peixinho no Báltico. Mas, finalmente, tal entendimento foi alcançado. O primeiro problema, como já disse, quando ocorre uma avaria no gasoduto, é prejudicado extraordinariamente em primeiro lugar a população de esturjões. O sistema ecológico do Cáspio, o seu carácter único consiste na presença da população de esturjões, que se extingue precipitadamente hoje e que devemos salvar de qualquer modo. Outro momento é ligado à situação sísmica, diferentemente do Báltico, onde terramotos são um fenómeno muito raro. Infelizmente, desde o ponto de vista sísmico, a zona do Cáspio é muito mais arriscada. Por isso, falando de terramotos, compreende-se que os riscos de roturas de infra-estruturas, tais como os gasodutos, são bastante sérios. Por outro lado, sobe o risco de avarias com todas as consequências ecológicas daí decorrentes. Quanto a esturjões, também surge um problema, porque uma parte de ecologistas consideram que a construção do gasoduto será uma certa barreira acústica para esturjões que não poderão atravessar livremente o Cáspio. Deste modo, será perturbado o seu movimento livre, ligado à sua vida, à desova, etc., causando também consequências nefastas para o meio ambiente. Por isso, naturalmente, hoje os riscos ecológicos da construção de tais gasodutos no Cáspio são enormes. Por enquanto nem o Turquemenistão, nem o Azerbaijão, nem a União Europeia podem explicar como será possível diminuir estes riscos. Por isso, este problema é bastante sério. Mas, para além de problemas ecológicos há, como já disse, problemas jurídicos, porque hoje em dia…
Gasparian: Porque há um problema enorme ligado à militarização do Cáspio, que se reflecte em todo o sector.
Simonov: Este problema existe de facto. Hoje, a posição da Rússia é bastante lógica. Dizemos que há cinco países costeiros – a Rússia, o Cazaquistão, o Turquemenistão, o Irão e o Azerbaijão, cinco Estados que devem entender-se quanto ao estatuto jurídico do Cáspio. Vamos fixar que todas as decisões serão tomadas através do consenso de cinco países e ninguém mais pode intervir nestas decisões, ou seja não pode haver nesta área Bruxelas, Pequim ou Washington. Porque Bruxelas, Pequim e Washington não têm uma saída ao Cáspio e este problema não faz parte da sua competência. Só estes cinco Estados podem resolver este problema através do respeito recíproco. Mas, infelizmente, esta posição não é partilhada sempre pelos nossos parceiros no Cáspio. Por exemplo, a ideia do gasoduto trans-cáspio, quando o Turquemenistão e o Azerbaijão propõem construí-lo sem consultar a Rússia. Vamos construí-lo e tudo. Mas esta posição é bastante provocadora. Vemos hoje que os nossos vizinhos do Cáspio, em vez de negociar, aplicam uma outra táctica e, por outras palavras, começa o processo de militarização. Os países gastam-se com novos tipos de armamentos. Tal diz respeito ao Irão e ao Azerbaijão e, em menor grau, ao Turquemenistão. Deste modo, a militarização do Cáspio decorre a ritmos bastante rápidos. Por outro lado, é necessário levar em consideração que há problemas muito próximos, por exemplo, o Nagorny Karabakh. Sim, este problema não diz respeito directamente ao Cáspio, mas é muito próximo. O Azerbaijão, tendo muito altos rendimentos da exploração de jazidas petrolíferas do Cáspio, investia volumes bastante sérios no rearmamento das suas Forças Armadas. Hoje, Baku tenta resolver o problema do Nagorny Karabakh pela via da força. Este também é um problema. Deste modo, infelizmente, a tensão militar no Cáspio e ao redor do Cáspio cresce muito rapidamente. Isso cria riscos adicionais. Esperamos, contudo, que o problema do Cáspio seja resolvido pacificamente. Mas devemos ter em conta que se no Cáspio forem realizadas, infelizmente, decisões abertamente provocadoras, tais como, digamos, a construção do gasoduto trans-cáspio sem o consentimento da Rússia, sem a determinação do estatuto jurídico do Cáspio, a reacção da Rússia, a meu ver, poderá ser adequada e, infelizmente, com o uso da força. Mas, aliás, trata-se dos nossos interesses. E se estes forem abertamente violados, se não forem respeitados os respectivos acordos, é evidente que a resposta, infelizmente, poderá ser, como se dia, simétrica e adequada. Por isso estou fortemente preocupado com a militarização do Cáspio, vendo que os nossos parceiros preferem hoje investir em armamentos e não tentam resolver o problema do Cáspio pela via negocial. Destaque-se que a pressão militar na Rússia não tem perspectivas. Porque, sejamos francos, comparar o orçamento militar da Rússia, não se trata de modo algum da demonstração da força, não é uma ameaça, mas comparar objectivamente o orçamento militar da Rússia com os nossos vizinhos do Cáspio, entendemos que são coisas absolutamente diferentes.
Gasparian: Kostantin Vassilievitch, a última pergunta que tenho tempo de fazer hoje. Por quê razão os Estados Unidos, apesar de tudo isso, os Estados Unidos fazem avançar o projecto de Corredor Sul, não dando atenção a nada e afirmando com teimosia que ele será realizado de qualquer modo?
Simonov: Este é de facto um tema muito curioso. Por quê razão? Por que os Estados Unidos não estão presentes ali geograficamente. Vamos ver o mapa, onde se encontram os Estados Unidos e onde se encontra o Cáspio. Pergunte-se para que os Estados Unidos intervêm nestes processos. Porque mesmo teoricamente os produtos energéticos do Cáspio não serão fornecidos aos Estados Unidos. Mas, no entanto, os Estados Unidos fizeram lobby ao conhecido oleoduto Baku-Tbilissi-Jeikhan, cuja ideia foi apresentado como avanço desde o ponto de vista de que a Rússia teria exclusivo monopólio de fornecer produtos energéticos do Cáspio. Contudo, hoje o oleoduto encontra-se praticamente vazio apesar de ter sido inaugurado com grande entusiasmo e apresentado como um projecto potente. Mas, na realidade, foi esquecido calcular os volumes de fornecimento do Cazaquistão e os volumes de extracção de petróleo no Azerbaijão, assim como o custo do trânsito do Cazaquistão através do Azerbaijão à Europa e do transporte do Cazaquistão para Novorossiysk. Por outras palavras, hoje para o Cazaquistão é mais vantajoso fornecer petróleo através de portos russos e não de transportá-lo através do Azerbaijão à Europa. Vemos deste modo que a política, infelizmente, destrui a economia. E alguns projectos simplesmente não têm economia. Vemos, por exemplo, que há cargos muito surpreendentes, tais como o representante especial para a Energia da Eurásia. O senhor Morningstar fala constantemente coisas muito provocadoras, por exemplo, de que é necessário construir um gasoduto trans-cáspio sem consultar os russos, porque é um assunto interno e que o Turquemenistão e o Azerbaijão devam coordenar a construção deste projecto. Não é necessário qualquer consenso no Cáspio. Eles irão entender-se e nós daremos a eles uma cobertura política.
Naturalmente, tal posição é provocadora. A lógica dos Estados Unidos é, em geral, evidente: o país tenta tornar-se mediador no fornecimento de produtos energéticos dos países do Cáspio à União Europeia. A lógica é clara: aqueles que controlam o trânsito, têm instrumentos de pressão na União Europeia. Sim, os Estados Unidos e a União Europeia podem ser considerados como parceiros. Mas, ao mesmo tempo, conhecemos que têm uma série de divergências. É uma boa ideia política ter um instrumento de pressão na União Europeia. Os Estados Unidos proclamaram desde há muito o Cáspio como zona dos seus interesses. Os Estados Unidos colaboram muito densamente com o Azerbaijão e com o Turquemenistão. Finalmente, não se deve esquecer da Turquia. Os Estados Unidos têm grande influência na Turquia e, como já disse, gasodutos atravessam o território turco. Deste modo, propõe-se à Europa o projecto de Corredor Sul, que, aliás, foi elaborado nos Estados Unidos, tal como, por exemplo, o projecto Baku-Tbilissi-Jeikhan e foram os Estados Unidos que fizeram lobby a este último, como já disse. Deste modo, forma-se um elo de trânsito controlado pelos Estados Unidos. E, naturalmente, a União Europeia encontra-se numa situação muito complexa, porque, se estes projectos forem realizados, ela ficará numa forte dependência em relação aos Estados Unidos.
Gasparian: Konstantin Vassilievitch, muito obrigado por ter encontrado tempo para responder às nossas perguntas. Lembre-se que hoje o convidado do Serviço Russo da Voz da Rússia por telefone foi o director-geral do Fundo de Segurança Energética Nacional, Konstantin Simonov. 

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